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quinta-feira, maio 21, 2015

A "mónada" humana - em cada homem a humanidade



Cada homem contém em si toda a humanidade. De facto, se pensarmos que cada homem/mulher é expressão particular de um código genético comum a todo o género humano (genoma); que cada homem/mulher contém em si traços comuns a toda a espécie, que refletem precisamente a história evolutiva da espécie em geral (5 dedos das mãos, um neocórtex cerebral, bipedismo, etc.), torna-se evidente que o geral está imbuído no particular, o Todo na Parte. É aquela ideia ontológica-metafísica da mónada, de que o Todo é, ao mesmo tempo, totalidade em extensão e compreensão; isto é, o Todo não apenas está por toda a parte absolutamente, como está, absolutamente, em cada uma das suas partes. 

Veja-se o simples átomo: ele não é uma expressão parcial das leis do universo. Ele não depende, para ser átomo, de outros átomos. Ele é, por natureza, absoluto, no sentido em que todas as leis do universo estão nele contidas e nele se exprimem absolutamente: força electromagnética, força nuclear forte, força nuclear fraca. Todas estas forças, no seu conjunto, não vêm de fora do átomo, mas emergem da sua própria constituição, brotam misteriosamente da relação entre as partículas que o constituem (electrões, protões, neutrões, etc.), como se já estivessem contidas, como possibilidades, na "medula" ontológica dessas partículas. O Universo que podemos ver - e o que não podemos ver - está por toda a parte, mas tudo aquilo que ele que é "extensivamente" brota, "compreensivamente", dos seus constituintes mais básicos e fundamentais. Se há alguma permanência nas leis do universo, isto é, se aquilo que é verdade aqui, em termos físicos, é verdade na galáxia vizinha, ou nos confins do universo conhecido, é porque o que é verdade para um átomo da minha pele é verdade, fundamentalmente, para qualquer átomo, aqui ou a biliões de biliões de quilómetros daqui. Do mesmo modo, a uma escala menor, o que é verdade para uma rosa que brota na minha roseira, é verdade para uma rosa que brota numa roseira na China, ou na Papua Nova Guiné. 

Esta constância que pervade o universo como um Todo só é possível porque cada uma das suas partes, cada uma das suas partículas ou complexos de partículas, cada um dos "tijolos da criação", contribui para ela com a mesma "solidez" física, com a mesma "absoluteidade" ontológica, sendo cada um uma expressão absoluta, total - embora particular - das leis do universo, ou pelo menos contendo em si, radicalmente, o potencial a partir do qual todas essas leis - a bem dizer, um novo universo - podem a qualquer momento emergir. Um átomo, só para tomar o exemplo mais óbvio de um "complexo de partículas", contém em si, a bem dizer, o potencial para um novo universo, sendo ele próprio, pelo modo como os seus constituintes se relacionam entre si para fazer emergir as leis físicas, um universo por direito próprio, bem radicado na fonte de onde brotam todas as leis e toda a criação - a insondável e sempre fugidia realidade última; a natureza fundamental, fundacional, absoluta do real. 

No fundo, cada átomo, cada partícula, sendo expressão particular de um absoluto, é idêntico à semente, ao grão de pólen, à célula animal ou vegetal, que embora constituindo uma parte muito ínfima, quase negligenciável, da planta, da flor ou do animal, contêm em si o potencial para a emergência de um novo indivíduo completo, total, absoluto à sua maneira, igual, no fundamental, a qualquer outro indivíduo da sua espécie, predecessor ou contemporâneo. E é assim que o Universo progride e avança, de acordo com o poema de Alberto Caeiro: sendo todo em cada coisa, pondo quanto é no mínimo que faz. 

E é assim que cada homem se faz realmente Homem. Sendo expressão digna de si, da sua dignidade ontológica, que assenta no facto de que ele é, não apenas um indivíduo, um cidadão, uma identidade particular; não apenas uma mera função social/profissional, uma simples peça de engrenagem, mas a expressão viva, encarnada, total e absoluta à sua maneira, da Humanidade, mas também, e de forma mais geral e fundamental, da Vida, do Universo, do Real.